O STF entende que a reclamação constitucional pode ser intentada perante os tribunais de justiça, desde que haja previsão na respectiva Constituição Estadual e, ainda, no regimento interno do tribunal.
A adoção da reclamação constitucional no âmbito dos tribunais de justiça, segundo entendimento firmado pelo STF, decorre do princípio da simetria dos entes federados e, bem ainda, do princípio da efetividade das decisões judiciais. O mesmo STF, ainda, entendeu que a simples previsão de reclamação em Regimento Interno do TST é insuficiente para autorizar o seu processamento sem previsão legal não pode haver reclamação.
A reclamação constitucional nasceu na jurisprudência do STF com fundamento no princípio dos poderes implícitos: os tribunais têm poderes implícitos, a exemplo do poder geral de cautela. Os poderes implícitos dos tribunais são necessários ao exercício de seus poderes explícitos. Tendo os tribunais o poder explícito de julgar, têm o poder implícito de dar efetividade às próprias decisões e o de defender a própria competência. Para exercer esse poder implícito, concebeu-se a reclamação constitucional. Em virtude de tais poderes implícitos, inerentes a qualquer tribunal, deve-se admitir a reclamação constitucional perante os tribunais.
Acontece, porém, que o STF entende que a reclamação constitucional pode ser intentada perante os tribunais de justiça, somente se houver previsão na Constituição Estadual e, igualmente, no regime interno do respectivo tribunal, em razão do princípio da simetria. O princípio da simetria, como se sabe, impõe a reprodução de algumas regras de competências federais para o âmbito estadual. Assim, se o STF, que é o órgão de cúpula, tem competência para processar e julgar reclamação constitucional, o tribunal de justiça, que, simetricamente, é o órgão de cúpula do Estado-membro, teria competência para processar e julgar a reclamação, com vistas a exercer seus poderes implícitos de fazer valer suas decisões e impor respeito às suas atribuições institucionais. O princípio da simetria relaciona-se, como se observa, com o federalismo. O órgão de cúpula de cada Estado-membro deve ser correspondente, de maneira simétrica, ao órgão de cúpula da União, não sendo diferente com os órgãos do Poder Judiciário. O STF firmou esse seu entendimento no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade, tratando-se, portanto, de orientação vinculante. Cumpre reiterar que, ao firmar esse entendimento, o STF valeu-se de vários argumentos: a) a reclamação situa-se no âmbito do direito constitucional de petição previsto no art. 5º, XXXIV, da Constituição Federal, consagrando-se, então, como um direito de qualquer legitimado perante qualquer tribunal; b) o instituto da reclamação está em consonância com o princípio da efetividade das decisões judiciais, constituindo um importante instrumento de defesa das garantias constitucionais do processo; c) o fundamento da reclamação constitucional decorre do princípio dos poderes implícitos; d) no âmbito dos Estados-membros, é possível caber reclamação constitucional em razão do princípio da simetria, desde que prevista na Constituição Estadual e, igualmente, no regimento interno do respectivo tribunal.
Não há lei que preveja reclamação perante o Tribunal Regional Federal. Essa circunstância por si já seria suficiente para que, na linha da jurisprudência do STF, não se admitisse reclamação perante esse tribunal. Além disso, os tribunais regionais federais não são, como é evidente, órgãos de cúpula dos Estados-membro. Eles compõem a organização da Justiça Federal, sendo seus órgãos de segunda instância. Assim, mais um dos fundamentos que compõe a ratio decidendi da orientação firmada pelo STF não se encaixa na realidade dos tribunais regionais federais. Se a reclamação é cabível no âmbito do tribunal de justiça em virtude do princípio da simetria, tal fundamento não se revela adequado relativamente aos tribunais regionais federais. Por tal motivo, também não seria cabível a reclamação no âmbito do TRF.
Mas o desenvolvimento histórico da reclamação prescindiu da existência de lei; a ação surgiu a partir da aplicação da teoria dos poderes implícitos do tribunal, como o próprio STF reconhece. A Lei n. 8.038/1990, que regulamenta a reclamação perante o STF e o STJ, e que serve como parâmetro para a reclamação perante o TJ, é posterior à consolidação do instituto na jurisprudência do STF. Atualmente, seria possível, por idênticas razões, construir a reclamação perante o TRF pela interpretação do direito positivo brasileiro, agora com mais facilidade, tendo em vista a ampla consagração da reclamação tanto na jurisprudência quanto na legislação. A reforçar essa linha de argumentação, há ainda a circunstância esquisita, de difícil compreensão para o leigo, de admitir-se reclamação perante o TJ e não admitir-se reclamação perante o TRF.
Enfim, a jurisprudência do STF permite que se desenvolvam argumentos favoráveis e contrários à possibilidade atual de uso da reclamação perante o TRF. Entendemos, porém, que a tese da “necessidade de previsão legal” tende a prevalecer na jurisprudência e, assim, enquanto não sobrevier lei que a regulamente, a reclamação perante tribunal regional federal não seria admitida.
Fredie Didier Jr e Leonardo Carneiro da Cunha
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